Mauro Loch

ANÔNIMOS E INSUSPEITOS

4.9
(16)

A arbitragem brasileira passou dos limites da incompetência e alcançou o intangível nível da dúvida sobre a lisura do que faz.

Não que esse nível já não tivesse sido alcançado antes, até comprovadamente, com direito a inquéritos e condenações judiciais, que redundaram incrivelmente na realização de novos jogos para substituir os anteriores, maculados pela corrupção. Foi a célebre corrupção da corrupção.

Definitivamente, alterar resultados com novos jogos foi uma das piores escolhas de nossos dirigentes do futebol, que esperamos não acontecer de novo.

Esse período, cujo ápice foi a demonstração da corrupção, é longo, passa por atuações vexatórias de árbitros com nomes famosos, escolhidos para partidas decisivas com o escudo de supostas boas arbitragens em outros jogos, e veio a ter fim com a utilização do VAR.

O VAR teria decidido uma copa do mundo em outras mãos, teria eliminado seleções nas prévias das copas, teria salvado e provocado expulsões, e, cada vez que assisto a jogos de países europeus, me convenço de seu acerto, o auxílio à falibilidade humana.

Só que no Brasil, sempre há a tropicalização do produto, para que se adapte às condições diferentes de nosso imenso país, e aí me convenço do erro da ferramenta.

O VAR, no Brasil, talvez com mais intensidade do que em outros locais também tropicalizado, virou álibi dos crimes cometidos pelos árbitros em campo, trouxe a soberba para ilustres desconhecidos, escudados pelo anonimato e pela distância da torcida. Eles têm nomes, sim, inclusive divulgados nas transmissões, mas ninguém sabe quem são, ninguém lembra quem são, apenas a sigla VAR.

Este incomparável poder do anonimato, do oculto, transformou o VAR na carta de alforria das barbáries sem autor. Não foi o árbitro de campo, não foi o VAR, foi algum tipo de decisão colegiada, ora contestada, ora acatada, mas de um grupo cujo apito é soprado por um só, coletivo, e quando é coletivo, não é de ninguém.

Claro que posso ficar apontando lances estapafúrdios, com diferentes “interpretações” pelos mesmos árbitros de campo e do VAR em situações cuja identidade só não é a mesma pela camisa que os jogadores envergam. Por um tempo, circulou um vídeo que quizz, em que as imagens de lances fantásticos eram sombreadas, para que se adivinhasse o autor da façanha. A pegadinha estava nas autoras dos lances dos mais variados esportes, e as respostas sempre confluíam para homens. Marta era uma delas.

Pois o VAR deveria ser assim, já que são anônimos, a análise deveria também ser anônima. Sentados em uma sala centralizada, o VAR deveria analisar os lances pela projeção sombreada, sem saber que são os envolvidos (claro que somente seria válido para jogos simultâneos), e tenho certeza que os “equívocos” seriam bem reduzidos, aí sim na condição da falibilidade humana.

Na impossibilidade de se fazer isso, minha outra sugestão é o VAR mudo, sem opinião. Vimos (ouvimos) em determinados lances a determinação do VAR em apoiar a versão da cabine, convencendo o árbitro de campo de que errou na sua interpretação. Pois o VAR deveria ser um chamado para o vídeo, só isso. O árbitro de campo que se vire, que veja o lance por outras câmeras e ângulos, e decida, sem o “apoio” das opiniões anônimas “isentas”. Nos lances de impedimento, chama o auxiliar, o bandeirinha, e ele decide se a cabeça faz parte do corpo para dar impedimento.

E se isso vai gerar uma série de paralisações no jogo, é só copiar os outros esportes. O mesmo aconteceu com o tênis, em que a verificação livre das jogadas passou a gerar paralisações por jogadores mais espertos, para quebrar uma sequência, irritar o adversário, etc…, e a solução foi a limitação das verificações. Muito embora a bola fora ou dentro não permita interpretações, a verificação do VAR sob demanda seria uma boa solução para tirar do poder anônimo e insuspeito a possibilidade de mudar o curso do jogo.

Os jogadores sabem quando sofreram falta, sabem quando houve bola na mão, sabem quando simulam, e o tropeço no cadarço do adversário dentro da área não seria verificado, assim como o gol de Maurício contra o Flu, de Estevão contra o Colo-Colo, e de Caio Vidal (acho) contra o Aflético.

Um x número de verificações em cada tempo, por demanda do capitão ou treinador, em até 20 segundos (ou mais) depois do lance,  e que usem da melhor forma que acharem.

O VAR foi uma ótima ideia, mas a tropicalização foi ruinosa, a ponto de gerar mais dúvidas ainda sobre a sempre duvidosa arbitragem brasileira.

Paralelamente, já que o “erro” humano não seria eliminado, o gancho deveria ser imediato. Inaceitável que a equipe de VAR que ajudou o Flu contra o Inter seja a mesma que ajudou novamente o Flu contra o Fortaleza. Aí não é só o VAR, aí já é mais encima na cadeia hierárquica da CBF.

Este texto nem foi pensado em relação aos jogos do Inter, mas pela agressão do Gabigol ao Scarpa, sem bola, no jogo de ontem, e pelo pênalti absurdo do Vidal no Gomez.

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