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Em algum momento da vida – e cedo – surge a necessidade de que o(a) menino(a) se defina, seja quanto ao seu sexo, seja em relação ao futebol. Nesse último, duas possibilidades: gosto / não gosto.

Se opta pelo “gosto” surge a questão: para qual time torcer? As razões pela qual a escolha é sobre o “A” e não sobre o “B”, “C”, “n”, são inúmeras, passando pela família, amigos, momento do clube escolhido, cor da camisa, TV Globo, etc.

Ultrapassado esse rito de passagem, o(a)  menino(a) faz parte de um conjunto de pessoas que se denominam torcedores. Nesse grupo não está mais só: a individualidade é trocada pelo coletivismo. Ser torcedor é usar camisas do time, ir ao estádio, sentar ao lado de pessoas que não conhece mas são amigáveis, gritar junto, cantar as mesmas coisas, bater palmas, vaiar, chamar o juiz de filha da puta (existe alguma coisa mais sadia na vida do que isso?  nem yogurt natural com granola), ou estar na sala, na frente da TV, e se comportar olhando a imagem virtual como se verdadeira fosse (tá! é verdadeira mas não é? OK… adiante), fazendo tudo que um torcedor deve fazer.

Emoções: se chorei, ou se sorri, o importante é que emoções eu vivi….. Argh! Roberto…. Mas ser torcedor é isso mesmo: ter emoções.  E mais: alguns pagam mensalidade, vão a bares para torcer junto com outros iguais, bebem nas derrotas, nas vitórias e nos empates;  pelo que se conclui que inexiste relação entre bebida e o resultado da partida. Taí uma boa ideia para tese de mestrado.

Até aqui tudo muito bem, tudo muito bom, mas…..O que é exatamente torcer? De onde vem esse termo?

Eruditos dizem que se origina do latim “torquere”, que significa torcer, adulterar, virar, desvirtuar, atormentar.  Outros dizem que o termo foi criado pelo escritor Coelho Neto, torcedor do Fluminense. Em priscas eras, futebol era jogo de elite: as mulheres iam ao estádio empiriquitadas (minha mãe usava essa expressão que acho interessante), com luvas em uma temperatura de 40 graus; durante o jogo sentiam calor, tiravam as luvas e as torciam e retorciam durante a partida. Os homens de chapéu palhinha também os tiravam e torciam as abas. Em resumo: todos torciam alguma coisa. Eram os torcedores….

Como não sou intelectual, prefiro a segunda hipótese à primeira.

Ser torcedor é mover-se pela emoção, paixão, coração, quase ou mesmo totalmente pelo fanatismo. Isso muitas vezes impede  a visão racional de fatos, isenta e imparcial. Exemplos: nosso zagueiro violento é viril, o do adversário é um assassino; penalty não marcado para nós é igual a juiz ladrão, e o não marcado para o adversário é um sorrisinho meia boca . Ou seja: torcedor vê apenas o que é favorável.

Sócrates dizia que “uma vida sem reflexão não merece ser vivida”; faço uma “homenagem” a ele (eufemismo para plágio, mesmo)  e digo que uma vida sem emoção não merece ser vivida. E no futebol, é muito bom ter essa emoção por um time mesmo que seja o atual Internacional.

A tal força da torcida, que tem todos os contornos de um belo sentimento, é ao mesmo tempo e paradoxalmente, uma situação que fragiliza o torcedor. Ao não ver ou não querer ver coisas, cego pela paixão, se deixa levar por histórias mal contadas, argumentos pífios (esperei muito para associar esse “pífio” a alguma coisa: é para recordar um que tinha sobrenome parecido com isso, pois recordar é ser masoquista).

São histórias mal contadas: de repente, uma porção de gente larga seu escritório, sua construtora, seu consultório, sua casa, sua mulher (alguns até adoraram essa parte) e filhos (esses, em alguns momentos é bom largar mesmo, principalmente quando são aborrecentes), e vão ser diretores de um  clube por dois anos. E mais: não ganham nada pela dedicação e altruísmo. Você, caro(a) e raro(a) leitor(a), pode fazer isso? Alguém que tenha que trabalhar para ganhar a vida pode? Quem vai pagar as contas da luz, água, gás, telefone, colégio/faculdade das crianças, a pensão da(o) “ex”, a picanha do Barranco, o bacalhau do Pampulinha, o sanduiche de pastrami do “seu” Marcos (delicatessen na Fernandes, quase esquina Henrique Dias, em frente ao Zaffari)?

São argumentos pífios: colorados devem se sacrificar pelo time; o clube precisa de nosso trabalho; nossa experiência administrativa irá engrandecer o clube. E entra ano e sai ano, mudam nomes e mudam nomes, e tudo segue igual.

Nós, torcedores que torcemos (vou repetir essa injúria ad eternun) somos fortes e fracos: acreditamos em um Inter forte, peleador (essa é pra gaúcho), que marca no campo do adversário, que não deixa espaços enormes entre suas linhas, que troca passes com precisão, que é agudo no ataque. E igualmente acreditamos em papais noéis, coelhinhos de páscoas, sacis, mulas sem cabeça e em dirigentes altruístas que só querem o bem de nosso time.

Somos incorrigíveis: somos passionais. E quer saber? Melhor ser assim. Como cantou o Genival Lacerda: “Nóis sofre mais nóis goza“.

Ou me ocorreu agora, melhor ainda. Dizia o nosso Quintana, a quem tive a sorte de conhecer :

Todos aqueles que ai estão

Atravancando meu caminho,

Eles passarão …

Eu passarinho!”

E que seja breve!

 

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