4.9
(62)

Meu velho pai não dirigia, nunca dirigiu. Naquela época não se tinha a liberdade de hoje, logo, o motivo por nunca ter aprendido eu até hoje não sei. Nunca perguntei. O mais estranho de tudo isso é que ele adorava automóveis, debatia sobre eles: motorização, modelos, clássicos e novidades do mercado. Para o padrão das nossas estradas na época, que mais pareciam um carreiro de boi de tropa, o que aguentava o tranco era a rústica Rural Willis, que ele teve duas e depois já construída pela Ford, blusa e saia, que teve uma.

O velho era um homem rude, sem muitos floreios e nada de luxo. Não se permitia a aventuras. Até que um teatino que flertava minha irmã mais velha apareceu com uma VW Variant, azul. Brilhou o olho do velho, que dias depois foi até uma concessionária e encomendou uma zero km. Vermelha: seu gosto pelo Colorado não era mero acaso. Voltou para casa, no dia seguinte foi ao banco para reservar o dinheiro para o saque (era assim naquele tempo), esperou o dia de buscar o carro, dois dias antes foi até o banco apanhar o dinheiro, colocou tudo em dois sacos de farinha e foi buscar o veículo. Pagou à vista e em dinheiro – nota sobre nota. Adorava aquela Variant, mas pouco teve a chance de aproveitar: um infarto fulminante levou ele não muito tempo depois.

Antes de vender a VW Variant vermelha – 1976, por ordem da minha mãe, fiz uma viagem a esmo com ela – sem rumo. Era eu, um irmão, a Variant e o poeirão das estradas. Numa bodega de beira de estrada na serra, numa localidade chamada Faxinal, paramos para almoçar. Um lugar bucólico, parado no tempo, jeitão dos anos 60 – quiçá 50: um rádio fanho, uma cancha de bocha numa lateral do estabelecimento, um bodegueiro virado em bigode, cachaça amarelada, cerveja quente e a mulher do bodegueiro vindo da cozinha com uma costelinha de porco das melhores que já comi na vida.

Pois, ontem, no interior de São Paulo, vencemos o porco numa daquelas vitórias improváveis, ao menos para quem vivencia estes últimos anos do Internacional. Um time coeso, vamos combinar, que jogou com autoridade de campeão contra um campeão. Essa vitória da noite passada é daquelas que, ao final do campeonato, se mostram fundamentais à campanha. Campanha de título. O time parece ter amadurecido a ponto de poder se pensar que se ilusionar com o título pode não ser trivial casualidade.

Certamente não foi a melhor costelinha de porco que já comi na vida, mas era a melhor naquele momento em que a fome era de uma vida inteira. E é também a que me liga a história daquela viagem que fiz em homenagem ao velho, na sua Variant Vermelha que tanto apreciava, naquelas estradas de chão batido em que o vento e a poeira entravam pela ventarola assobiando um pouco de felicidade de estar vivo e poder sorver tudo aquilo.

Certamente não foi a melhor vitória contra o porco que tivemos em nossa história, mas ao final do campeonato, quando a taça – enfim – reencontrar o seu destino no Beira Rio, será a melhor vitória sobre o Palmeiras de toda uma geração – de uma vida inteira. E neste dia eu chegarei no Gigante, tal qual aquele vento que me cortava estrada, assobiando de felicidade de estar vivo e poder sorver tudo aquilo. De novo.

Tudo de novo com o velho (e vermelho) Internacional.

 

CURTAS                                                                              

– Eduardo Chacho Coudet estava na mesma estrada em que passei e soube escolher bem o seu caminho a seguir, após um tempo parado numa encruzilhada;

– Verdade seja dita: Chacho já merecia ter derrubado Abel em Sampa no longínquo campeonato nacional de 2020;

– Wanderson segue apaixonado e maleixo na bola. Maurício segue na encruzilhada. Bustos até anda devendo, porém ninguém jogou mais na temporada;

– Wesley tem se mostrado uma grata surpresa. Não só pelo gol mas pelo que vem desempenhando sempre que tem oportunidade. Será deveras útil;

– Pênalti não é ação entre amigos. Logo, Borré não tinha que ter batido. Mas foi dele a jogadaça do gol, antes de perder um gol cabeceando sozinho. Em breve desencanta e aí azar dos adversários. Paciência;

– O jovem Gustavo Prado, pacato e na dele, lembra aqueles jogadores advindos do Salão. Levo muita fé no guri;

– Agora é ganhar no carpetão;

– Jogos da Copa do Brasil devem ser tratados como precisam ser tratados: revanche! Sem dó ou qualquer tipo de piedade;

– Barcellos falou para a imprensa do centro do país e talvez tenha que dar atenção só para ela mesmo. Deixa os amorfos daqui mordendo os próprios cascos.

 

PERGUNTINHA

Vamos sonhar tudo de novo, meu povo Colorado?

 

A vida num assobio de felicidade haverá de ser a sina do Inter!

PACHECO

How useful was this post?

Click on a star to rate it!

As you found this post useful...

Follow us on social media!